A moda na contemporaneidade e o desejo de desejar

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Imagem: Foto de Annie Leibovitz

*Por Carlos Alberto Alves e Silva

Tenho observado que os interesses dos estilistas nem sempre estão em sintonia com os dos consumidores, mesmo os mais descolados, de vanguarda, modernos.

Os consumidores demonstram interesse particular na utilização de um produto, que além de satisfazer uma necessidade aparente também comunique de maneira não verbal sua condição emocional, afetiva, socio-econômica-política e estética.

Por exemplo, uma pessoa que veste determinada roupa (sapato, bolsa, jeans, vestido,) ou usa determinados objetos (caneta, celular, carro) comunica consciente e inconscientemente, mais do que “um estar na moda”, seu estado de espírito – alegre, deprê, poderosa ou submissa, boa condição financeira, politicamente correta, ou simplesmente se esta de bem com sua estatura, peso, tempo e espaço. Seu gozo pode ser marcado quando seu objetivo – conscienciente ou inconsciente – é alcançado, afetando o outro: na sedução, submissão, admiração ou mesmo inveja.

Por outro lado, o interesse dos estilistas, entre outros profissionais da extensa cadeia da moda, é de saber o que circula no mercado e antever o que virá na próxima coleção: matéria-prima disponível, cartela de cores, tendência e anseios dos produtores e consumidores. Seu gozo não se limita em saber que sua coleção foi um sucesso nas passarelas, mas no demonstrar da criação do novo, inusitado e convertê-lo em conceito e finalmente em produto a ser consumido.

O estilista, portanto não pode ser aquele que consome o que está disponível (já é passado), mas sim aquele que já está consumindo o futuro, as idéias, o que está ainda no imaginário vanguardista e ainda será convertido em produto para completar o campo simbólico dos consumidores. Esta pode ser uma das razões da eterna ansiedade, marcada pela busca não de um produto de consumo, mas do desejo do outro.

Estas são duas faces de uma mesma moeda. E nunca a moda foi tão difundida entre todos os estratos e rodas sociais, profissionais e leigos de diferentes idades, etnias e culturas. A moda tangencia também saberes como psicologia, antropologia, sociologia, economia, filosofia e psicanálise.

A cadeia da moda tem uma extensão muito maior do que a criação, produção e venda. É fundamental considerar nesta cadeia, o processo de criação, tecnologia têxtil, processo de produção e o parque industrial, economia formal e informal (pirataria) e todos os mercados que derivam desta cadeia: editoriais, desfiles, fotografias, mídia (TV, Internet, Jornais, Revistas, etc), publicidade e propaganda, centro de distribuição (carro, caminhão, avião), canais de vendas (lojas, shopping center), centros da moda (NY, Paris, Milão, Tokyo), até o consumidor final.

Todo mundo quer estar na moda e de alguma forma está ligado a ela querendo ou não. É interessante que através da história da moda percebemos que não é um tema novo (vestir e consumir), então o que este tema apresenta de diferente na contemporaneidade? Esta é uma longa discussão que poderia ser tema de tese de mestrado e doutorado.

Estamos vivendo um mundo de abundância como nunca visto na história da humanidade. O que é produzido e desperdiçado é mais do que suficiente para atender as demandas dos seres humanos (não quero entrar em questões sócio-politica-econômicas), todos sabemos que enquanto uns passam necessidades básicas, outros esbanjam e desperdiçam, o que também faz parte do humano-tão-humano. O fato é que os estudos e pesquisas, tecnologias disponíveis e recursos financeiros disponibilizaram e possibilitaram o acesso de produtos a grande maioria da população. Desta forma, a preocupação das pessoas medianas extrapolam questões objetivas acerca da sobrevivência (comer, vestir, proteger-se) para além do consumo – aquilo que é subjetivo, o desejo.

A constituição subjetiva e inconsciente do sujeito é marcada pelo desejo de desejar, desta forma não há produto que vá satisfazer a um único ser. Ora desejo “isto” e acho que se o tiver serei eternamente feliz, até que quando realizo meu sonho de consumo e percebo que não basta, quero agora “aquilo” pois “aquilo” é o que vai me deixar eternamente feliz. E assim, sucessivamente, sem cessar. Desta forma, o que nos move não são os objetos e sim o desejo de desejar.

O trabalho dos profissionais de criação, incluindo o estilista é de manter esta cadeia desejante em movimento, não podendo fixar-se em um produto, mas na escuta do desejo do outro para transformá-lo em produto ou serviço.

*Carlos Alberto Alves e Silva. Psicanalista e economista, com pós-graduação em Administração pela USP e Marketing pela ESPM. Tem MBA em Gestão Internacional pela Thunderbird School of Global Management – Arizona – USA e formação nas áreas de Psicologia e Filosofia. email: carlos@imeridiano.com

11 Respostas to “A moda na contemporaneidade e o desejo de desejar”

  1. PRISCILA ALVES RIBEIRO Says:

    OLÁ, SOU PSICÓLOGA E GOSTARIA DE INFORMAÇÕES SOBRE CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA MODA.OBRIGADO

  2. CLAUDIA Says:

    Gostaria de saber se existe algum curso de psicologia da moda..pleasee!!! estou no 4 ano de psicologia…grata

  3. Grupo Papeando Says:

    Olá Claudia,
    seja bem-vinda!
    Provavelmente, no Brasil não há curso de Psicologia da Moda. O que é possível é, estando formada em Psicologia, você pode fazer uma especialização ou mestrado numa das seguintes áreas: Psicologia da Arte, Artes Visuais, Artes Plásticas, Design, Moda, Psicologia do Comportamento, Psicologia Analítica ou Psicologia Social. Aí, você pode te rcomo tema de pesquisa da sua monografia ou dissertação, as relações entre Psicologia e Moda. Em cada uma das área listadas o enfoque dado ao tema seria diferente, em função dos fundamentos teóricos que as constituem, seria você e o(a) seu(ua) professor(a) orientador(a) que definiriam a melhor forma de trabalhar com isso. Mas seria uma forma de juntar as duas áreas.
    Apareça mais vezes!

  4. Karina Bonotto Says:

    Olá, sou psicóloga, trabalho com a abordagem da psicanálise e fiz minha monografia sobre o tema o sujeito e a moda: a passarela e o olhar do outro. Minhas pesquisas tiveram como base o lugar da modelo no mundo da moda. Hoje pretendo dar continuidade para esse estudo, visto que sou pioneira nessa construção.
    Será que você poderia me dar uma orientação de como continuar? Obrigada.

  5. Lilian De Paula Says:

    Eu gostaria de saber que tipo de cargos ou atividades poderiam ser execidas na prática por um psicólogo com especialização ou mestrado em Design, Moda ou Psicologia do Comportamento.

  6. luiza garcia Says:

    Também sou formada em Psicologia e apaixonada por moda, penso que a forma como o indivíduose veste é a manifestação de sua personalidade, vivências e desejos inconscientes.

  7. Grupo Papeando Says:

    Olá Karina,

    bom, como você é pioneira, o caminho é qualificar-se nas áreas afins, ou seja, tentar estabelecer um diálogo entre a psicanálise e a moda. A pesquisa, seja numa especialização ou num mestrado, é um bom caminho para o estabelecimento desse diálogo. Fazendo uma pós-graduação em áreas como Artes, Moda, Psicologia Social ou da Personalidade, Antropologia, Filosofia ou História da Estética ou da Arte, você terá condições de trabalhar melhor, e mais profundamente, as relações entre as duas áreas que te interessam. No processo de pesquisa você poderá pensar metodologias de trabalho ligando as duas áreas e, também, pesquisar mais detalhadamente a produção teórica existente nesses campos.

    Quando se é pioneiro em alguma coisa, é preciso ter ousadia e coragem para correr riscos, o que significa criar! O pioneirismo pode ser muito bom, pois nos dá visibilidade e nos permite uma boa margem de autonomia sobre como fazer as coisas, já que há muito pouco, ou nada, pronto. Por outro lado, o pioneirismo suscita muitas críticas porque é normal as pessoas reagirem muito criticamente a propostas teórico-práticas que ainda não estabelecidas.

    Seja como for, há sempre a recompensa de fazer o que se quer fazer e o que se gosta, e isso não tem preço!

    Seja bem-vinda, sempre!

  8. Rose Rios Says:

    Olá! acabei de mudar o curso de arquitetura,para moda.Estou cheia de dúvidas mais feliz e querendo conhecer melhor o mundo da moda.Obrigada!

  9. Francisco Says:

    Há o curso de Pós Graduação em Consultoria de imagem e de tendências em moda que tem disciplinas muito voltadas para Moda e Psiicologia.

  10. Moda e psicologia | mulheresucesso Says:

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