Como as Religiões Encaram a Morte

A Morte Em Seu Pálido Cavalo” por William Blake(1757-1827)

Candomblé

Significado: a vida continua por meio da força vital do indivíduo. A parte imperecível do corpo (ou “ori”) não acaba, afirma o antropólogo Acácio Almeida Santos. E toda morte é fruto de uma intervenção.

Preparação: cultivando sempre sua força vital, pois as pessoas podem mudar seus destinos, apesar de existirem interferências na morte.

Reencarnação: o “ori” volta para a mesma família, mas em outro corpo. Já os homens fortes, que têm filhos, maturidade, prestígio social e morte aceitável, tornam-se ancestrais.

Ritual: denominado “axexê”, o rito funerário começa após o enterro e costuma durar vários dias. Na cerimônia, algumas pessoas que têm relação com o morto são chamadas para participar do ritual em que o espírito do corpo é encaminhado para outra terra. Nessa passagem, elementos simbólicos e materiais (objetos pessoais sacralizados) são quebrados e jogados em água corrente.

Luto: a morte é uma desordem que leva tempo para ser superada. Após alguns anos, aquela pessoa passa a interferir na energia vital do grupo ao qual pertencia.

Catolicismo

Significado: é vista como uma passagem, a porta de entrada para a ressurreição. “A religião enxerga apenas os vivos e os ressuscitados. Não existem mortos”, diz o padre Paulo Crozera, coordenador da Pastoral Universitária da PUC-Campinas.

Preparação: ter em mente que a vida é um dom divino e deve ser vivida da melhor forma possível.

Reencarnação: todos serão ressuscitados porque Cristo é quem livra a pessoa do pecado, mas não existe a reencarnação. Corpo e alma são uma coisa só.

Ritual: vela-se o corpo e, além das orações populares que costumam ser feitas durante o velório católico, como o pai-nosso e a ave-maria, um padre ou ministro faz uma celebração para encomendar a vida da pessoa para as mãos de Deus. As velas, colocadas ao lado do caixão, simbolizam a luz de Cristo ressuscitado e a vida que vai se consumindo, mas que sempre brilha.

Luto: são feitas celebrações em memória do morto no sétimo dia, no primeiro mês e no primeiro ano. Acredita-se que esse processo precisa ser vivido para que se possa lidar da melhor forma com a morte.

Espiritismo

Significado: a morte não existe porque acredita-se na eternidade do espírito. “O corpo é uma veste, e a reencarnação serve para o espírito evoluir”, diz Ana Gaspar, que faz parte do Conselho Doutrinário do Centro Espírita Nosso Lar Casas André Luiz.

Preparação: aprende-se a agir após os estudos de livros de Allan Kardec, pai do espiritismo. Como acredita-se que o médium é intermediário entre os vivos e a alma dos mortos, isso significa que existe a possibilidade de comunicação com o espírito que já deixou aquele corpo.

Reencarnação: quando o corpo morre, o espírito se desliga e fica no mundo espiritual estudando e se preparando para uma nova reencarnação. As encarnações acontecem até o espírito atingir sua evolução.

Ritual: o corpo é velado e enterrado ou cremado. As preces ajudam o caminho para o mundo espiritual.

Luto: não existe porque não se acredita na morte.

Islamismo

Significado: passagem desta vida para outra, eterna. “Quem fizer o bem será julgado por Deus e vai para o paraíso. Quem fizer o mal também será julgado e irá para o inferno”, diz Abdul Nasser, secretário-geral da Liga Juventude Islâmica do Brasil.

Preparação: desde a infância é passada a noção de que tudo que começa tem um fim.

Reencarnação: não acredita. A alma teve tempo suficiente na terra para cumprir sua tarefa. Ritual: o corpo é lavado pelos familiares -sempre do mesmo sexo- e enrolado em três panos brancos. Depois, é colocado em um caixão para que os parentes mais próximos se despeçam e levado à mesquita. A partir daí, apenas os homens participam.

Luto: dura três dias. Quando a mulher perde o marido, o tempo sobe para 130 dias, período em que ela não pode sair de casa, a não ser em emergências.

Judaísmo

Significado: é o fim do corpo material. “A verdadeira pessoa, que é a alma, é eterna”, diz o rabino Avraham Zajac.

Preparação: a criança aprende desde o início que a vida é feita de mudanças.

Reencarnação: existe outro mundo, para onde as almas vão, chamado de “olam habá” (mundo vindouro). No entanto a alma pode voltar para a terra num outro corpo para completar sua missão.

Ritual: o corpo é envolvido em panos brancos, e o caixão é fechado para que ninguém mais o toque. Familiares e amigos rezam salmos. Parentes próximos cortam tecido da roupa para mostrar o luto.

Luto: na primeira semana, os parentes se reúnem para rezar em casa. Apenas o espiritual conta, por isso os espelhos da casa, que refletem o corpo material, são cobertos. A pessoa é lembrada na data de morte por todos os anos seguintes.

Protestantismo

Significado: período de transição para outra vida, explica o pastor Fernando Marques, da Igreja Metodista Central de São Paulo.

Preparação: ter fé na palavra de Deus, que julgará o destino da pessoa no céu ou no inferno, não a partir das ações dela, mas pela sua fé.

Reencarnação: não existe. Acredita-se em uma próxima vida em comunhão com Deus.

Ritual: velório e enterro são feitos em homenagem à família do morto.

Luto: não há regras.

Zen-Budismo

Significado: o corpo se transforma em elementos básicos da natureza, mas a energia das ações e das palavras continuam repercutindo na terra por muito tempo, diz a monja Coen de Souza.

Preparação: meditação, que possibilita a compreensão de que tudo é transitório e interligado.

Reencarnação: renascimento é a palavra mais apropriada. Acredita-se que um ser mais “verdadeiro” (mais puro) vai retornar.

Ritual: flores, velas e incenso no velório. Os parentes usam roupas escuras, e são feitas preces.

Luto: preces ou transcrições de textos sagrados durante 49 dias a cada sete dias.

FONTE: Folha de São Paulo (08/11/2001)

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