Casamento, Desenvolvimento Adulto e Felicidade

*Por Angelita Corrêa Scardua

Todos somos influenciados, quer gostemos ou não, pelos desígnios socioculturais do momento histórico no qual nos encontramos. Fomentadas pelas particularidades de cada época, as predisposições coletivas em relação a aspectos essenciais da experiência humana – como o sexo, o poder, a democracia, a beleza, o casamento, a virtude e muitas outras – adquirem um caráter incontestável. É assim que um conjunto de valores e ideias tendem a ser aceitos pela maioria como sendo verdades naturais e indissociáveis da condição humana.

A partir desses valores e ideias axiomáticas formam-se padrões, aos quais os indivíduos tentam se adequar no intuito de serem considerados parte integrante da coletividade. Na opinião do psiquiatra suíço Carl Jung(1875-1961), essa “submissão” aos padrões socioculturais estaria profundamente vinculada à primeira fase da vida adulta. Dessa forma, Jung defende que a tarefa do indivíduo durante a primeira metade de sua vida consiste em estabelecer-se no mundo, cortar os vínculos da infância que o ligam aos pais, arranjar um parceiro sexual e iniciar uma nova família. Continue lendo »

A Hora “H”

A crise de meia-idade masculina é descrita por psicoterapeutas e médicos como um dos mais desestruturantes processos experimentados por um homem

*Por Fernando Savaglia

Com 44 anos de idade A.S. tinha um excelente cargo dentro de uma multinacional. Casado há mais de duas décadas, mantinha uma relação extraconjugal com uma jovem estagiária da área de marketing de sua empresa. Durante meses trocaram e-mails e mensagens combinando encontros num explícito jogo de sedução. Na época, o executivo acreditava que esta relação era uma forma de aumentar sua autoestima e aliviar o tédio de seu casamento. No entanto, quando o “caso” estava próximo de completar um ano, a jovem resolveu se afastar e, ainda que não tenha decretado um rompimento total, acabou por desencadear uma verdadeira revolução na vida do executivo. Ávido por entender o motivo do desencantamento, aos poucos A.S. foi tomado por crises cada vez mais frequentes de ciúme. Reconquistar o afeto da moça virou uma obsessão. Aos poucos, os jogos de sedução, que até então eram encarados como algo prazeroso, se transformaram em algo sofrido e desestruturante. Além de passar o dia tentando adivinhar e prever os pensamentos da garota, passou a exibir crises de ansiedade alternados com momentos de melancolia. A angústia do executivo chegou a um ponto que teve de se afastar do trabalho por dias, o que alterou substancialmente sua rotina em família e colocou seu casamento em risco. Continue lendo »

Encontros, Relações e a Sizígia

“Homem e Mulher Contemplando a Lua” Caspar David Friedrich (1774-1840)

*Por Selene Regina Mazza

“Como se sabe, não é o sujeito que projeta, mas o inconsciente. Por isso não se cria a projeção: ela já existe de antemão. A conseqüência da projeção é um isolamento do sujeito em relação ao mundo exterior, pois em vez de uma relação real o que existe é uma relação ilusória” (JUNG, 1986, p. 7). Jung, ao apresentar esta afirmação, lança-nos a refletir sobre como encontros e relações se constituem e que efeitos estes terão sobre o desenvolvimento psíquico de cada indivíduo, ou seja, como um encontro com o outro se processa na alma se esta relação pode ser “ilusória”? Sendo ilusória, torna-se então necessária à individuação? Continue lendo »

A Ética dos Encontros Descartáveis

*por Silvia Graubart

Falar de amor e sexo no século XXI implica refletir sobre a “sociedade do espetáculo” descrita pelo polêmico pensador francês Guy Debord. O autor analisa uma forma de estar no mundo em que a vida real é, inexoravelmente, pobre e fragmentada – e as pessoas são obrigadas a assistir e a consumir passivamente as imagens de tudo que lhes falta em sua existência subjetiva. Essa perspectiva me remete ao termo “ficar” – rótulo informal para os encontros efêmeros e descartáveis, nos quais ver, ser visto e aparecer reduzem os casais a machos e fêmeas no cio. Os pares são transitórios, os arranjos duram apenas algumas horas, talvez dias. Ou minutos. É o tempo do desejo saciado. Continue lendo »

Valorizações Afetivas nas Representações de Contos de Fadas: Um Olhar Piagetiano

contosdefadas_piaget_maxfieldparrish_inocencia Imagem: Maxfield Parrish – Inocencia

Instituto de Psicologia da USP

Apresentação

O construtivismo de Piaget e sua teoria da inteligência dispensam apresentações. Menos conhecidas, contudo, são as concepções do autor sobre o papel das valorizações afetivas na construção do conhecimento e no desenvolvimento da inteligência e da moralidade. Para este autor, as escolhas de objetos, ações e aspectos da realidade para interagir, assim como as modalidades de julgamento moral, sofrem a influência das valorizações afetivas. Assim sendo, a configuração e seleção de qualidades admiráveis (materiais ou abstratas) nos outros e em si mesmo, necessariamente se relaciona ao desenvolvimento do juízo moral, da inteligência e da afetividade. (…) Continue lendo »